quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Carta Aberta de ex-integrantes em defesa do Conselho Curador da EBC - Empresa Brasil de Comunicação

Os sistemas de radiodifusão de serviço público não comercial têm sido, ao longo da história da comunicação nas democracias, uma notável marca civilizatória. Na Europa, tendo a BBC britânica como sua principal referência, esses sistemas representam até hoje, não obstante o avanço da radiodifusão comercial, uma alternativa de programações jornalísticas, educativas e culturais recebida e admirada pelas sociedades em que estão inseridas. Mesmo nos Estados Unidos onde, a exemplo do Brasil, a radiodifusão comercial foi dominante desde suas origens, o sistema PBS – Public Broadcasting Service – é conhecido e respeitado por seu jornalismo equilibrado, seus documentários aprofundados, sua dramaturgia desvinculada da superficialidade comercial e sobretudo, por seus programas infantis e juvenis de indiscutível qualidade educativa e cultural.

A EBC, Empresa Brasil de Comunicação, foi criada no Brasil para ser, nos limites de nossas possibilidades políticas, culturais, sociais e econômicas, um sistema de radiodifusão de serviço público não comercial que, ao longo de seu desenvolvimento, almejasse chegar um dia a ser, se não uma BBC, por conta das diferenças estruturais do desenvolvimento da radiodifusão na Europa e no Brasil, mas, ao menos, uma prestadora de serviço público nos moldes da PBS americana. Uma prestadora de serviço público de radiodifusão não comercial, mantida em parte por recursos públicos, em parte por apoios culturais e patrocínios, em parte por prestação de serviços à sociedade.

Mas, criada em 2008, a EBC mal teve tempo de, nos termos formulados pelo Conselho Curador em 2012, rever seu modelo institucional, por meio de seminários internos e debates com a sociedade ao ser atingida por intempestiva decisão do novo governo, que, na prática, destrói aquele modelo, ao, entre outras medidas, extinguir o Conselho, ao qual cabe assegurar, por força da representação social de que é revestido, a autonomia da empresa e o estrito cumprimento da lei que a criou.

Não deixa de ser paradoxal, no momento mesmo em que a sociedade e o Poder Judiciário reivindicam medidas de controle sobre o Estado e, em particular, sobre as empresas estatais, que a única empresa pública a ter, definido por Lei, um Conselho Curador – ativo e operante – seja alcançada por uma medida que esvazia, quando não impede, o exercício de controle que se torna uma exigência dos valores democráticos aplicados à gestão de autarquias e empresas estatais.

Os abaixo-assinados, ex-integrantes do Conselho Curador da EBC, vêm a público apelar ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo no sentido de que reformem a decisão de encaminhar e acolher a Medida Provisória que, na prática, ao extinguir o Conselho Curador, extingue o primeiro, e ainda em curso, processo de se ter no Brasil uma experiência fundamental de radiodifusão de serviço público não comercial, pública, autônoma e inclusiva.

Como ex-integrantes do Conselho Curador da EBC, que deram início e participaram do debate de revisão e melhoramento do modelo institucional da empresa, nos colocamos à disposição das autoridades responsáveis daqueles poderes, em harmonia com o atual Conselho, com a direção da empresa, com as mais diversas representações da sociedade, para, juntos, não deixarmos morrer no Brasil uma iniciativa civilizatória à altura das mais nobres esperanças democráticas e cidadãs, para este e qualquer outro país.

Em 06 de setembro de 2016

Assinam:

Cláudio Lembo

Jurista, professor universitário, ex-governador de São Paulo

Daniel Aarão Reis

Professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF)

João Jorge Rodrigues

Presidente, Samba Reggae & Cidadania

Luiz Gonzaga Belluzzo

Economista, professor universitário, foi presidente do Conselho Curador da EBC

Maria da Penha Fernandes

Militante feminista e inspiradora da criação da lei federal no. 11.340/2006, batizada com seu nome: Lei Maria da Penha.

Murilo César Ramos

Professor e pesquisador do Laboratório de Políticas de Comunicação (LaPCom), da Universidade de Brasília (UnB)

sábado, 3 de setembro de 2016

Conselho Curador diz que mudanças na EBC são inconstitucionais

O Conselho Curador da EBC divulgou nota em repúdio de forma veemente à Medida Provisória 744. Segundo o conselho, a medida "é uma afronta aos princípios constitucionais que estabelecem a comunicação pública como um direito da sociedade brasileira". A nota destaca ainda que a MP foi publicada no dia em que ocorreria a 63ª Reunião Ordinária do Conselho Curador, na qual seriam deliberados assuntos importantes envolvendo a grade de programação dos veículos da EBC, a destinação dos recursos da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública e a renovação do próprio Conselho.

Veja a nota na íntegra:

O Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) repudia de forma veemente a Medida Provisória 744, publicada nesta sexta-feira (02/09/2016) que acaba com o caráter de empresa de comunicação pública. A MP 744 é uma afronta aos princípios constitucionais que estabelecem a comunicação pública como um direito da sociedade brasileira. A medida fere o artigo 223 da Constituição Federal, que prevê a complementaridade dos sistemas público, privado e estatal.

A MP 744 extingue o Conselho Curador e assim tira a autonomia da EBC em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão e agências.

Também foi publicado nesta sexta-feira decreto que exonera o diretor-presidente da EBC Ricardo Melo, contrariando uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que garantiu a legalidade do mandato em junho.

Composto por representantes de vários setores da sociedade civil, do Congresso Nacional, do Governo, e dos funcionários da empresa, o Conselho Curador tem atuado para garantir a diversidade de vozes nos veículos da EBC. Além da vigilância constante para o cumprimento dos princípios que regem a EBC, ao longo dos últimos oito anos, o Conselho Curador foi responsável por demandar a criação de uma faixa de diversidade religiosa na TV Brasil e nas rádios da EBC, orientar a empresa na criação do seu manual de jornalismo, recomendar e cobrar diversidade de gênero, raça, orientação sexual e acessibilidade em todos os conteúdos, defender a cobertura de pautas relacionadas aos direitos humanos, apontar as diretrizes para os planos de trabalho anuais da empresa e promover mais de dez audiências públicas para debater temas diversos como a produção independente e regional.

Cabe ressaltar que a MP 744 extingue o Conselho Curador no mesmo dia em que ocorreria a sua 63ª Reunião Ordinária, em que iria deliberar sobre assuntos importantes envolvendo a grade de programação dos veículos da EBC, a destinação dos recursos da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública e a renovação do próprio Conselho.

Os/as integrantes do Conselho Curador se juntam às iniciativas da sociedade civil contra a MP 744 e na firme defesa da EBC e da Comunicação Pública.

Representantes da sociedade civil no Conselho Curador da EBC
Rita Freire (presidenta)
Ana Maria da Conceição Veloso
Enderson Araújo de Jesus Santos
Heloisa Maria Murgel Starling
Ima Célia Guimarães Vieira
Isaias Dias
Joel Zito Araújo
Matsa Hushahu Yawanawá
Mário Augusto Jakobskind
Paulo Ramos Derengoski
Rosane Maria Bertotti
Takashi Tome
Venício Arthur de Lima
Wagner Tiso

Representante dos funcionários da EBC no Conselho Curador da EBC
Akemi Nitahara

Fonte: TelaViva News,
convergecom.com.br